O Ponto e a Vírgula - III

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Um dia, o ponto chegou a uma conclusão. Percebeu que, se não gostava de estar acompanhado, era porque não tinha, ainda, achado a companhia certa. Ele sabia que era assim, ele lembrava-se de tantas histórias de amores e desamores que ajudara a escrever, sabia que gostava mais de ser usado para estabelecer uma passagem de um estado bom para outro melhor, mas que abominava ter de ilustrar uma quebra. Ele sabia que podia ser feliz… Demorou a perceber, talvez até ainda não tivesse percebido correctamente, mas tinha de se fazer às frases, em busca de uma companhia idílica.


Outro dia, talvez o mesmo, a vírgula sentiu-se nova. Parecia que estava qualquer coisa muito bonita para chegar… Ela, que se tinha sentido tão desanimada, ela, a vírgula! Ela pressentia algo e o mais curioso era que esse algo não estava longe, estava até mais perto do que ela alguma vez imaginara. Quantas vezes falara com ele, quantas vezes passara por ele… E ele sempre tão sério, tão circunspecto, tão distante!


Como teria sido possível? A jovialidade dela, a insegurança dela, a timidez dela… Tudo isso lhe despertava uma vontade tremenda de lhe ser útil e de a proteger, mas só agora ele reparava nisso. Tantas vezes que a tinha observado, tantas vezes que tinha assistido à sua vontade de querer dizer tudo tudo tudo! Tantas vezes que olhara para ela…

O ponto chegou e aproximou-se da vírgula. A vírgula estremeceu, mas sentiu que a novidade, que ela tanto estudara e fora conhecendo, estava agora consigo.
O ponto e a vírgula são agora o pontoevírgula. Marcam uma sequência, mas também trazem uma diferenciação. Confrontam ideias e ideais, mas estão unidos nas suas ideias e nos seus ideais. Pontoevírgula, pontoevírgula…

"Eu não gostava de estar sozinho; agora gosto de estar sozinho com ela…
Eu tinha medo da solidão; agora gosto de me perder na nossa solidão…
Eu também não sabia estar acompanhado; agora sei que é sempre preciso algo mais…"

Pontoevírgula;

O Ponto e a Vírgula - II

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A vírgula achava que não fazia sentido se estivesse sozinha. Desejava sempre que antes e depois de si estivessem as suas amigas palavras, desde as mais humildes às mais caricatas. Admitia que embirrava um bocadinho mais do que a conta com o ‘e’, mas também era a primeira a assumir que, por vezes, precisava mesmo dele.
A vírgula, por si só, traduzia uma ideia de incompletude, ideia essa que arrastava outros ‘ins’ consigo: indefinição, insegurança, insatisfação… Oh, se não era assim! Quantas e quantas vezes escritores ávidos e insatisfeitos, ansiosos por deixar no papel todas as suas glórias e frustrações, os seus sentimentos mais fundos e as suas raivas mais superficiais, se serviam dela repetida e exaustivamente! Uma palavra VÍRGULA outra palavra VÍRGULA mais outra palavra VÍRGULA e mais outra palavra VÍRGULA até sabe-se lá bem, rondar o infinito! Mas, se a vírgula pensava que teria de estar sozinha ou que, a seguir a si, viria uma qualquer banalidade completamente desfasada do preciosismo anterior, ficava num pranto, muito encolhida e, durante uns tempos, quem quisesse escrever teria de dar asas à imaginação e conseguir uma forma de o fazer sem a vírgula. Foi assim que surgiram textos prolixos, ambivalentes e até famosas brincadeiras sobre testamentos!


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O Ponto e a Vírgula - I

13 de Agosto de 2008

O ponto era decidido, sabia sempre como terminar umas coisas e deixar que outras começassem. Era taxativo, directo, determinado. Era totalmente explícito, embora, por vezes, não soubesse se deveria estar sozinho ou chamar mais dois pontos amigos seus para que a mensagem passasse correctamente. Era este o grande dilema do ponto: ele nunca sabia se estar sozinho era mais saudável do que estar acompanhado, mesmo que, quando estivesse acompanhado, desejasse estar de novo só, cansado que estava de tantas contendas e confusões. No entanto, a verdade é que, se se via novamente sozinho, começava a questionar-se se estaria a cumprir a sua missão correctamente e, findas ou mal findas as questões, já estava a chamar um ou dois pontos seus amigos. Por instantes, cria que, de facto, era melhor deixar ideias em suspenso ou ser a serventia de enumerações.
Mas tudo era cíclico. Quando se cansava de introduzir milhares de ideias, objectos, sensações ou emoções, já nem nos raciocínios interrompidos, nas divagações quebradas, nas mensagens subliminares encontrava conforto. Retomava a sua solidão, a sua determinação, até que começasse, novamente, a duvidar da sua exactidão.

(...)

Vamos .

7 de Agosto de 2007

É bom saber que vives.
É bom saber que és real, no meio de toda a tua perfeição tão humanamente imperfeita.
Gosto de pensar em ti e nos sorrisos que me dás, os sorrisos que espelham o orgulho que sinto por tudo aquilo que és.
Sei que, mesmo quando estás fisicamente distante, nunca estás ausente. Pões o teu coração junto ao meu para que nenhum dos dois se sinta perdido e assustado com o silêncio do seu próprio palpitar.
Mesmo que me julgues, eu sinto-me grata. É a forma que arranjas para me chamares à razão e para me salvares do emaranhado de erros que me começa a envolver, ameaçando a minha capacidade de viver sorrindo, acreditando, lutando.
Gosto que te preocupes comigo. Quando perguntas como estou, mesmo que as atrocidades da vida já me estejam a fazer ceder, é como se a treva em que me encontro se desvanecesse por acção da mais bonita das luzes, a luz que tu irradias e que é tão mas tão tua, a luz que torna mais apaixonante e segura esta batalha que é a vida.
Admiro-te por dares sem receber na mesma medida. Sei que nem sempre retribuo toda a confiança, dedicação e respeito que depositas em mim.
O amor desmesurado que tenho por ti, a admiração que despertas em mim e o desejo de te ter para ouvir só as minhas histórias e as do meu coração fazem com que descure aquilo que realmente procuras em mim.
Amor? Sim. Admiração? Sim. Desejo? Sim. Confiança? Sim.
Mas… Eu sei que tu anseias que tudo isto seja dividido por dois corpos errantes, os nossos, à procura do mais bonito que o mundo tiver para oferecer. Só então seremos corpórea, mental e almamente unos. Cúmplices. Amáveis, amados, amantes.
Não te peço que me entendas até porque não tenho a pretensão de te entender. Só quero que fiques comigo.
Não quero que vás à minha frente para me mostrares o caminho. Não quero que vás ao meu lado para me amparares. Não quero que vás atrás de mim para me protegeres.
Quero apenas e tão somente que venhas comigo e eu prometo que vou contigo.
Seremos um. Não precisamos de preceder, ladear ou seguir nada nem ninguém, nem mesmo um ao outro.
Eu tenho-te. Tu tens-me. Sabemos o nosso caminho. É demais dizer que temos o mundo à nossa espera? É loucura dizer que não precisamos de mais nada? Vamos desbravar o mundo juntos, tão juntos que separar-nos será utopia.
Então, da nossa dualidade, nascerá a nossa unidade, a unidade mais singela de todas: o amor, o nosso amor.
Vamos. Não vês? Temos a vida à nossa espera.